8 de abril de 2015

Perdido em Outro Mundo...

Nada melhor que um vídeo de gameplay de um clássico jogo de ficção científica pra inaugurar o canal do Sentinela Positrônica no YouTube! Another World é um jogo desenvolvido por Eric Chahi para a Delphine Software e publicado pela Interplay em 1991. O jogo é uma aventura de ficção científica em plataforma 2D com animações cinemáticas feitas por rotoscopia e gráficos poligonais, algo extremamente inovador pra época. A versão usada no vídeo é a do 20º aniversário do jogo pra Playstation 4, espero que apreciem! Após o vídeo seguem a resenha do jogo e a promoção da semana, espero que gostem!





---------- S O B R E  O  J O G O ----------


A edição de aniversário de 20 anos do jogo pra PS4 foi usada na elaboração do vídeo de gameplay no YouTube e a versão pra PCs foi usada na geração das imagens do post.
A arma e o carro usado na criação das animações do jogo.
Another World é um clássico por definição. O jogo já é épico desde a sua concepção. Primeiro porque foi praticamente todo feito por um único sujeito em uma época em que a indústria de jogos começava dar passos cada vez maiores rumo à grandes empresas de desenvolvedores e/ou publishers com grandes equipes e orçamentos astronômicos. O francês Eric Chahi fez o jogo praticamente todo sozinho, desde a concepção da arte da caixa do jogo às linhas de programação que faziam a animação em rotoscopia funcionar em gráficos poligonais, um grande avanço pra época que o jogo fora concebido. A única ajuda que teve foi de J. F. Freitas que colaborou com a sutil trilha sonora do jogo. Segundo que, por mais que o jogo já esteja caminhando pra seu trigésimo aniversário, ele continua sendo relançado pras mais variadas plataformas, sempre com o cuidado de manter o jogo intacto, apenas com gráficos restaurados.

Metal Hurlant, n.1, a original francesa
A ideia do projeto surgiu da vontade de Chahi desenvolver um jogo diferente dos trabalhos que já vinha fazendo pra outras empresas de jogos. Ele queria fazer algo próprio onde pudesse imprimir toda sua criatividade e ideias e o primeiro conceito pro jogo veio das ilustrações de uma das suas revistas favoritas, a Metal Hurlant, mais conhecida como Heavy Metal nos EUA. A revista traz até hoje contos de fantasia e ficção científica e já influenciou muita gente, de Ridley Scott em Alien e Blade Runner a Tron, clássico da Disney que contou com designs do quadrinhista Moebius, um dos desenhistas regulares da revista. A imagem de um mundo alienígena belo e desolado como os muitos descritos regularmente na revista inspirou a Chahi a pensar no jogo que ia desenvolver. Moebius e Enki Bilal mandam abraços! Podem ter certeza que Metal Hurlant / Heavy Metal vão ser tema de vários posts por aqui no futuro!




Heavy Metal, a "Metal Hurlant" norte-americana. Ela vive! Até hoje continua sendo publicada! Vida longa à Heavy Metal!

O conceito de um jogo que não trouxesse nenhuma informação de pontuação ou status e contasse com uma apresentação sutil da narrativa não nasceu pronta. A abertura do jogo foi desenvolvida junto com o estágio inicial sem um roteiro pronto pro resto do jogo. De acordo com o próprio Eric, o projeto ia se desenvolvendo em função do level design, na medida em que as ideias surgiam, o trabalho fluía até que narrativa e jogabilidade encontrassem um denominador comum. O norte do projeto era a sutileza da narrativa e a experiência intensa e imersiva do jogador sem que nenhuma informação lhe fosse entregue mastigada. O jogo seria difícil, cruel com o jogador até que ele descobrisse o que deveria fazer pra sair de determinada situação.

Ainda vou ver o dia que um físico nuclear vai dirigir uma Ferrari...
Uma das "viagens do jogo".
Another World conta a aventura de um físico nuclear, Lester Knight, que vai parar num mundo alienígena após um acidente durante uma experiência com um acelerador de partículas. O nome do protagonista é algo que ficamos sabendo pela caixa do jogo mas nunca é mencionado durante o gameplay já que no começo da década de 90, caixas e manuais elaborados serviam pra contextualizar o jogador, diferente de hoje onde caixas são cada vez menos elaboradas e manuais vêm apenas em versão digital por mera formalidade, no jogo ele é chamado apenas de "professor" pela inteligência artificial que controla o laboratório. Logo que chega no mundo do jogo, Lester é recebido por um ambiente hostil onde o perigo está por todo lado, seja com os tentáculos na piscina onde se materializa ou nos seres que rastejam no chão e no teto do local, isso sem esquecer a fera que espreita ao fundo e logo acaba atacando o jogador quando ele progride até o final do cenário. Outro ponto a se destacar aqui é que por mais que o jogo seja um plataforma em 2D (com alguns momentos com um falso 3D), o jogador tem a liberdade de explorar os cenários indo pra direita ou esquerda pra cumprir os objetivos como bem entender, ao contrário do tradicional estilo de plataforma da época em que o jogador ia da esquerda pra direita apenas.

Lester Knight operando calmamente o experimento de seu computador, sem saber que em poucos instantes vai parar em outro mundo.

A chegada traumática no mundo alienígena em versão pixelizada,
uma das opções da nova versão do jogo, os gráficos restaurados
podem ser alternados com os gráficos da versão original.
Logo no final da primeira etapa do jogo o protagonista é capturado por uma civilização aparentemente desenvolvida. Ele é aprisionado junto com um alienígena que logo percebemos ser um escravo ou rebelde já que no cenário da prisão percebemos outros como ele trabalhando com picaretas ao fundo. Vale destacar aqui a criatividade de Chahi em comunicar os detalhes desse mundo alienígena em sutilezas como os alienígenas trabalhando no fundo do cenário e o guarda que corre chamar reforços na outra plataforma. Ao longo de todo o jogo o jogador verá cenários e situações em que, paralelamente a suas ações, a trama se desenvolve. Na prisão, assim que o jogador consegue derrubar sua jaula em cima do guarda, seu companheiro alienígena começa a ajuda-lo em sua fuga da cidadela hostil em que foi aprisionado. A parceria entre o jogador e o alien é algo que será desenvolvido até o final do jogo destacando sempre o ponto de vista do jogador que, assim como o personagem, precisa descobrir através das sutilezas do jogo a situação em que se encontra.




Na prisão, ao fundo, os escravos trabalhando enquanto o jogador e seu companheiro tentam fugir da jaula sob o olhar atento dos guardas... um deles vai se dar mal.

Particularmente uma das passagens que mais me encanta no jogo é quando jogador e alienígena escapam da prisão e chegam no elevador. Você pode descer e cumprir seus objetivos mas também pode subir ao topo da torre e ter uma chance de ver a cidadela como um todo. Essa cena dá uma perspectiva em um 3D simulado que comunica tudo que o jogador precisa saber sobre o jogo: ele está literalmente perdido em outro mundo. É um dos poucos momentos onde a trilha incidental de J. F. Freitas aparece e transmite muito mais espanto e encantamento que muitas outras trilhas que insistem em tocar ao longo de todo gameplay de jogos menos criativos. Esse vislumbre da cidade não é obrigatório ao jogador, não é algo que ele precise fazer pra terminar o nível mas é uma ação que engrandece ainda mais a experiência da narrativa.

A cidadela vista do topo da torre da prisão, meu grande momento no jogo.

Não pense que o jogo terá um final feliz ou que o jogador e seu companheiro alien conseguirão no final vencer os “malvados” e libertar seus companheiros com o protagonista voltando pra casa após seus atos de heroísmo e valentia. A trama não é feliz e não se preocupa em consolar o jogador em nenhum instante, seja nos momentos em que ele é separado de seu companheiro ou quando tem que se arrastar pelo cenário como puder pra sobreviver. Os desafios são muitos e todas as falhas do jogador serão punidas com a morte. Serão várias as animações em que o jogador terá de acompanhar resoluto a morte de seu personagem apenas pra poder recomeçar o trecho que ele falhou logo em seguida.

O último desafio do jogo: aparentemente o adversário é importante na sociedade alienígena.

Another World é um clássico da ficção científica porque abraça a possibilidade uma viagem a outro mundo sem o requinte e sofisticação de naves espaciais, o jogo inova ao assumir todas as possibilidades que a física de partículas traz ao mundo real, ainda que de uma forma improvável. A viagem faz mais sentido aqui que muitos outros artifícios usados na ficção. O jogo é um excelente exemplo da mais pura ficção científica porque apresenta um mundo hostil, com uma vida nativa a qual não estamos acostumados e onde os alienígenas falam qualquer coisa, menos um idioma conhecido. Aqui não há um tradutor universal mágico e o jogador não tem tempo pra aprender qualquer forma de expressão mais sofisticada que gestos entre ele e o companheiro alienígena. Sutileza é a palavra de ordem do jogo e isso fica claro quando percebemos que a sociedade alienígena do jogo além de adotar a escravidão também coloca escravos a lutar uns contra os outros como gladiadores em uma arena.

O final.

O jogo tem fãs em toda a indústria gamer, incluindo grandes nomes como Hideo Kojima, criador da série Metal Gear e Snatcher, outro clássico da ficção nos games. Apesar de ter sido criado em uma fase em que a indústria ainda permitia devaneios como um desenvolvedor criando sozinho todo um jogo, Another World permanece intocado até hoje como exemplo de narrativa e gameplay, um jogo que mescla uma trama fantástica com uma jogabilidade desafiadora. O jogo teve relativo sucesso de vendas e crítica mas não sem sofrer censura e mudanças. Pra começar a Interplay exigiu uma trilha sonora mais intensa e menos intimista como a de J. F. Freitas, algo que Chahi manteve oposição até vencer a briga. Nos EUA o jogo foi lançado como Out of This World e teve boa repercussão na versão pra Super Nintendo. Ainda assim, a versão de SNES sofreu com a censura do sangue alienígena nos tentáculos e na cena das termas onde as mulheres alienígenas não tinham mais seu “cofre” a mostra como na versão original do jogo, no console, a nudez das mulheres não era algo destacado na cena.

Out of this World, a versão norte-americana do jogo ganhou um nome diferente e uma capa pavorosa na versão pra consoles, era um bom port mas sofreu com alterações por censura e loadings demorados... e a capa, eu já falei da capa?

Capa de Heart of the Alien pra Sega CD.
O CD tinha o jogo original e a sequência.
Another World chegou a ter um projeto de sequência que seria desenvolvido pelo próprio Chahi e colocaria o jogador na pele do companheiro alienígena, revivendo toda a trama do jogo original mas do ponto de vista do alien. A ideia acabou sendo reaproveitada em parte pela Interplay anos mais tarde quando o jogo ganho uma versão pro Sega CD, a sequência chamada Heart of the Alien coloca o jogador na pele do alienígena que acompanha Lester no jogo anterior mas numa sequência de eventos posterior ao final do jogo original. Heart of the Alien não teve supervisão de Eric Chahi e, apesar de ser um jogo relativamente interessante, não consegue captar o espírito do original ainda que comece com um tom trágico.


Após o final do original, Heart of the Alien continua com
o jogador assumindo o papel do alienígena companheiro de Lester.








Eu conheci Another World como Out of this World em um floppy disk das antigas, daqueles de 5 polegadas que não armazenavam nem 1mB de dados. Na época mal passei do começo do jogo, tudo que consegui foi chegar no topo da torre na prisão mas isso já foi o suficiente pra me fisgar de vez pro mundo do jogo. A parte triste é que eu não era dono do computador e não podia continuar jogando. Só fui terminar o jogo em 92 no meu Super Nintendo quando descobri a fita do jogo pra minha imensa alegria. Apesar de hoje conseguir terminar o jogo em pouco mais de meia hora, na época fiquei várias madrugadas a fio, geralmente noites de sexta e sábado que meus pais deixavam jogar depois de mostrar minhas boas notas, tentando descobrir como vencer os desafios que o jogo apresentava. Meus pais foram muito espertos em me fazer estudar pra poder jogar já que o jogo havia virado uma obsessão pra mim, logo me deixar jogar madrugada adentro era uma forma justa de recompensar meu esforço na época. Se você vai descobrir o jogo agora, recomendo que faça como eu, jogue em silêncio, na madrugada, sozinho de preferência, garanto que a experiência será inesquecível. Em breve falaremos de outro clássico com o mesmo estilo e que foi diretamente influenciado por Another World e outros filmes e livros de ficção científica: Flashback.


A capa original do jogo, arte em óleo feita pelo próprio Eric Chahi.

* Saiba mais sobre o jogo no site oficial, lá você encontra uma biografia da produção do jogo escrita pelo próprio Eric Chahi, o texto está em inglês mas você pode ler traduzido em outros idiomas como Espanhol, Francês ou mesmo Alemão caso conheça os idiomas!

** Compre o jogo pra PCs no Steam aqui e no Good Old Games, ou GOG, aqui!



---------- P R O M O Ç Ã O ----------


Pra não deixar nossos seguidores passando vontade de jogar vamos brindar a versão digital no Steam do jogo pra 2 sortudos. Um deles terá que bolar uma frase que melhor descreva a experiência de se descobrir, de repente, vivendo em outro mundo. A frase mais criativa será escolhida por mim, a Evelise Couto do blog Casa de Um e a jornalista Thaís Pimenta. A frase deve ser postada aqui nos comentários do post e o resultado será divulgado dia 22/04.

O outro ganhador terá que assistir ao vídeo do gameplay do jogo e identificar uma passagem no vídeo, é algo bem simples: pra fazer o gameplay do jogo eu morri pelo menos umas 6 vezes enquanto jogava, todas eu disfarcei na edição do vídeo porém em 2 momentos é inevitável perceber que eu morri entre as edições e o próprio jogo entrega isso, quem descobrir uma dessas duas passagens e entregar nos comentários do vídeo no YouTube ganha no ato o jogo no Steam. Como essa forma de ganhar vai ser mais difícil, caso ninguém descubra até dia 22/04, a segunda melhor frase nos comentários do post aqui no blog vence. Mais difícil que editar as minhas mortes no jogo no vídeo foi propositalmente morrer em dois trechos e editar de modo a alguém poder ganhar essa promoção!!

Quem ganhar as promoções deve ter uma conta no Steam obrigatoriamente pra poder receber o jogo digitalmente em sua conta. Não é necessário ter um PC de outro mundo pra rodar o jogo, podem ficar tranquilos! A promoção vale apenas pro território nacional!